Dia das Mães: Uma Mãe, Muitas Lutas

Uma Mãe, Muitas Lutas: A Realidade das Mães Brasileiras

Na periferia da cidade de São Paulo, Ana Clara(*), uma mulher negra de 32 anos, acorda antes do sol. O choro de sua filha de 2 anos, Luana, ecoa pela pequena casa de fundos alugada no bairro do Capão Redondo. Ana, como muitas mães brasileiras, carrega o peso de ser a “mãe perfeita” e, ao mesmo tempo, a “trabalhadora ideal” – uma expectativa que, no Brasil, é ainda mais cruel para mulheres negras com filhos pequenos.

(*) Nome fictício.

Ana trabalha como assistente administrativa em uma empresa no centro da cidade. Seu trajeto diário, de quase duas horas entre um trem e um ônibus lotado, é apenas o começo de sua jornada. No trabalho, ela enfrenta olhares desconfiados quando precisa sair mais cedo para buscar Luana na creche, que, por falta de vagas públicas de qualidade, custa quase metade de seu salário. “Você vai voltar logo depois da licença, né?”, perguntou sua chefe quando ela anunciou a gravidez, com um tom que misturava preocupação e advertência. Ana sabia que, para muitas colegas, a maternidade foi o fim da carreira.

No Brasil, as desigualdades de gênero e raça moldam a experiência da maternidade. Dados do IBGE mostram que mulheres negras ganham, em média, 81,6% do salário de homens brancos (gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/noticias-e-conteudo/2024/Marco/mulheres-recebem-19-4-a-menos-que-os-homens-aponta-1o-relatorio-de-transparencia-salarial), e a taxa de desemprego entre elas é quase o dobro. Para mães solo como Ana, que representa 11,8 milhões de lares brasileiros segundo o mesmo instituto, o desafio é ainda maior. A ausência de políticas públicas concretas, como creches acessíveis e licenças parentais ampliadas, deixa essas mulheres em uma corda bamba. “Quero ser uma boa mãe, mas também preciso pagar as contas”, desabafa Ana enquanto embala Luana, que adormece em seu colo.

No ambiente corporativo, a pressão para ser a “trabalhadora ideal” – sempre disponível, sem distrações pessoais – ignora a realidade de mães como Ana. Ela já ouviu comentários de que “mães não são tão comprometidas” e percebeu que colegas sem filhos recebem mais oportunidades de promoção. A discriminação não é apenas sutil: uma pesquisa da FGV revelou que 48% das mulheres brasileiras são demitidas até dois anos após a licença-maternidade, com índices ainda mais altos para mulheres negras.

Ainda assim, Ana resiste. Nos fins de semana, ela leva Luana ao parquinho e sonha com um futuro onde sua filha não precise escolher entre ser mãe e ter uma carreira. Um sono possível seria poder participar de um grupo de apoio para mães negras, quase inexistentes no bairro e na maioria das cidades do interior do estado, onde compartilhar experiências e estratégias para enfrentar o mercado de trabalho. “Ser mãe no Brasil é uma luta diária, mas também é minha maior força”, diz, com um sorriso cansado, mas determinado.

Neste Dia das Mães, o Instituto Adolpho Bauer quer celebrar todas as mulheres como Ana, que desafiam as barreiras impostas por um sistema desigual.

A história dela é um lembrete de que apoiar as mães brasileiras exige mais do que flores ou presentes: exige políticas públicas inclusivas, ambientes de trabalho que valorizem a maternidade e uma sociedade que reconheça o valor das mulheres, especialmente as negras, que criam o futuro do país com seus filhos no colo.

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